Hoje em dia, a qualidade da venda e da experiência de um serviço de valor adicionado (SVA) é fator de decisão para o fechamento de qualquer nova parceria com a Oi, mais do que a inovação ou mesmo o potencial comercial do produto, afirma o diretor de serviços e produtos móveis da operadora, Roberto Guenzburger. A preocupação coincide com o amadurecimento do mercado brasileiro de conteúdo móvel, conforme explica o executivo em entrevista para Mobile Time. Nesse novo contexto, a Oi vai contratar uma ferramenta de controle de ciclo de vida dos seus assinantes de SVA e promete estabelecer punições para os parceiros que não atenderem as exigências de qualidade. O executivo ressalta a importância de se manter um diálogo multilateral entre os players do ecossistema móvel, incluindo as OTTs, com o objetivo de se encontrar modelos de negócios sustentáveis. E aponta as verticais de saúde, educação e entretenimento como as prioritárias em 2017 para a companhia.
Mobile Time - Quais as prioridades da Oi em serviços de valor adicionado (SVA) este ano, levando em conta o atual contexto de crise econômica no Brasil e a recuperação judicial pela qual a empresa passa?
Roberto Guenzburger - 2016 foi um ano da virada para a indústria de SVA, e na Oi também. Vivemos alguns cenários que aceleraram uma mudança sobre a qual já falávamos há muito tempo mas que demorava a acontecer. Agora o futuro chegou. Vivemos uma realidade muito diferente do que era três anos atrás. Era uma indústria baseada em push de serviços com menor valor agregado, em que o cliente comprava o serviço e nem sempre usava. Isso mudou em 2016. Tem a ver com a crise econômica, com o bolso do pré-pago, que está menor, e tem a ver também com o amadurecimento do cliente com os OTTs e com tudo que pode acessar no smartphone. Isso fez com que a gente tomasse uma série de atitudes de mudança de estratégia para privilegiar determinadas verticais no nosso portfólio que agregam mais valor para o cliente e trazem mais engajamento. É uma estratégia mais pull, com foco não apenas no pré mas no plano controle e no pós-pago, e que acreditamos que trará benefícios de longo prazo para a indústria. Percebemos que o modelo antigo chegou ao seu limite. Estamos nos estruturando ao longo de 2017 para implementar esse novo modelo, para viver uma nova realidade.
Quais as características dessa nova realidade?
O cliente terá o poder de escolher o serviço que quer. Ele vai buscar esses serviços. E a gestão do ciclo de vida e da experiência com o conteúdo estará dentro da operadora, no caso dos serviços oferecidos pela tele. O desafio para os parceiros será trazer produtos e serviços que agreguem, que gerem engajamento e que o cliente utilize no seu dia a dia. É uma mudança grande em relação ao modelo antigo, quando o objetivo era vender, empurrando os serviços para os clientes. Agora buscamos modelos mais sustentáveis, que gerem fidelização maior do serviço. E há algumas verticais nas quais dá para competir com OTTs, em parceria com outros OTTs.
Quais verticais a Oi vai priorizar?
Em primeiro lugar, saúde. Temos um hub de saúde, o Mais Saúde, que tem uma série de serviços e vamos agregar outros no curto prazo, nos próximos meses. Saúde é uma das prioridades absolutas. Acreditamos que com novas tecnologias de Internet das coisas (IoT) e possibilidades de monitoramento isso terá grande valor no longo prazo. No curto prazo, conseguimos oferecer serviços que são competitivos no universo de OTTs. A outra vertical prioritária é a educação, para a qual teremos uma novidade dentro de 60 dias. E, por fim, entretenimento, somando vídeo e música. Em vídeo, temos o Vídeo Curtas, serviço que vai ser reformatado por completo, incluindo conteúdo de vídeo mais rico, como filmes e séries. Teremos parcerias com OTTs na área de video, eventualmente, alavancando a nossa convergência. Já temos parcerias com OTTs no mercado residencial em vídeo.
Com quem são essas parcerias?
Lançamos no final do ano passado uma parceria com HBO Go e Crackle oferecendo na banda larga independentemente da TV por assinatura. A ideia é evoluir essa plataforma de vídeo on demand para dentro da mobilidade, porque clientes consomem cada vez mais vídeo no celular, já que as telas estão ficando maiores. Todo mundo identifica que consumo de vídeo no smartphone é tendência forte. Queremos serviços que nos diferenciem, seja em parceria com OTTs ou com a nossa marca.
E em música? Os grandes players de streaming já têm parcerias com teles brasileiras, como Deezer com a TIM e Napster com a Vivo. Sobra o Spotify, mas não sei se está procurando uma parceria com operadora.
A Oi tem hoje o Toca Aí, que é um serviço de rádio customizada. Estamos avaliando algumas alternativas que serão lançadas dentro de três meses. O primeiro semestre para SVA promete. Está todo mundo trabalhando 24 horas aqui. Estamos assoberbados de trabalho.
Sobre vídeo, vocês lançarão algum serviço com conteúdo produzido especialmente para celulares?
O Vídeo Curtas são vídeos criados para o celular. Mas as pessoas estão usando o smartphone para consumir vídeo tradicional: o que assistia na TV agora quer assistir no ônibus, no metrô, no avião. Minhas filhas não usam a TV mais. E as telas estão aumentando. A experiência de uso de vídeo no celular está ficando excelente. Tem gente que prefere ver séries e filmes no celular. Trabalhamos com esta visão.
No fim de 2015 a Oi começou a incluir SVAs como parte integrante de alguns dos seus pacotes. Como anda essa estratégia agora?
O Oi Toca Aí faz parte do pacote controle com cartão de crédito. Mas pensamos nos próximos meses em ter outros SVAs incluídos tanto no controle quanto no pós-pago. Serão serviços com maior grau de diferenciação e mais valor para o cliente. Porém, é importante não tirar o poder do usuário. Não queremos obrigá-lo a consumir um serviço. Levamos isso em conta na hora de definir a estratégia de empacotamento. Queremos deixar o usuário com o poder de escolher o que ele quer.
Seria como oferecer um menu de SVAs para o cliente montar no seu plano?
Estamos discutindo isso. Mas o "monte você mesmo" também tem seus problemas. Pode ser um fracasso se for muito complicado. Enfim, estamos estudando. Está na nossa estratégia empoderar o usuário.
Alguns dos seus concorrentes mantêm parcerias de zero rating com OTTs. O que acha desse modelo?
Tivemos zero rating no plano Oi Galera por um período curto. É uma estratégia com prazo de duração. Não dá para trabalhar com zero rating como um pilar de diferenciação de um produto. Tem que ser estratégia com começo, meio e fim definidos, e com objetivos claros. Uma vez atingidos, deixa de ser necessária. Zero rating foi usado no passado para estimular o uso de dados, para as pessoas experimentarem a Internet móvel. Na nossa visão, é mais interessante ter estratégia de pacotes de dados com tamanhos que sejam mais adequados para a necessidade do cliente do que direcionar o consumo zerando a tarifação de determinados tipos de conteúdo. Isso não quer dizer que a gente não experimente no futuro outros tipos de modelos, como navegação financiada por publicidade, data rewards, zero rating patrocinado etc.
Nos EUA, está voltando essa onda de dados ilimitados, às vezes para um tipo de conteúdo, como streaming de vídeo.
Na minha visão, dadas as restrições de capacidade do mercado brasileiro, por conta da dimensão continental, acho que a tendência é de crescimento dos pacotes de dados e redução da estratégia de zero rating direcionado. Alguns concorrentes tiraram zero rating que tinham no ano passado, e mantiveram poucos. Acho que isso continua este ano. Zero rating agrega complexidade e acho que o consumidor brasileiro não está tão maduro. Acho mais fácil em 12 a 24 meses haver um aumento dos pacotes com qualquer tipo de uso do que o retorno do zero rating.
A Oi pretende adotar o modelo de data rewards?
É tendência do mercado a adoção do mobile marketing inteligente, que não se resume a vender inventário. Um exemplo é o data rewards. São empresas que usam o recurso de acesso à Internet como moeda de troca para oferecer promoções, fidelizar clientes etc. Acredito bastante nessa tendência. Temos algumas iniciativas embrionárias, mas com grande velocidade de crescimento. E há outras iniciativas amadurecendo que devem entrar até o final deste semestre. É uma tendência importante para o pré-pago, cuja carteira está encolhendo. Quanto mais conseguirmos botar recursos de fora do ecossistema tradicional, melhor.
Poderia descrever esse teste que a Oi está fazendo com data rewards
O cliente assiste a um vídeo, responde a uma pesquisa e ganha dados. Isso aparece quando o cliente tenta acessar a Internet e não consegue (porque a franquia acabou). Estamos em piloto em determinados DDDs.
Quem é o parceiro nesse projeto?
É a Supportcomm. Mas também avaliamos outras alternativas de data rewards, usando promoções não apenas digitais, mas no varejo fisico, com parceiros grandes e pequenos. Esse negócio vai crescer muito. Acredito muito na estratégia do Google de rentabilizar através da cauda longa. A barreira é ter modelos que sejam facilmente compreendidos pelo cliente final e que ele possa fazer essa compra de maneira simplificada, como acontece no Google Adwords.
Um ano atrás a Oi começava a experimentar uma plataforma da Gemalto para a entrega de mensagens multimídia, em HTML5. Qual o balanço um ano depois?
Estamos colocando SDKs nos nossos apps para que nossos clientes possam visualizar essas campanhas. A conversão é muito superior a qualquer outra ferramenta. Mas a base habilitada ainda é pequena, em torno de 5% do total de assinantes da Oi. Estamos realizando campanhas para a atualização dos apps, como Minha Oi, Oi WiFi, Oi FM etc.
O Google está promovendo a adoção do RCS como novo padrão do serviço de mensageria das teles. Pouco antes do Mobile World Congress, foi feito o anúncio sobre a adesão de dezenas de operadoras ao redor do mundo, mas não havia nenhuma brasileira. A Oi pretende adotar RCS?
Eu senti uma mudança substantiva este ano no evento (MWC, em Barcelona). Deixamos de ter um evento em que as teles falavam de problemas de negócios e os OTTs falavam das suas maravilhas. Agora temos um evento mais focado em discussões estratégicas para viabilizar novos modelos de negócios, em como o ecossistema sobrevive e floresce de forma que todos possam ganhar dinheiro. Virou um diálogo multilateral entre todos os parceiros, incluindo os OTTs. Todos estão bastante preocupados em dar sustentabilidade ao ecossistema de hoje. E a parte mais fragilizada hoje são as operadoras, que precisam fazer o Capex e cujas redes viabilizam os OTTs. Com o Google discutimos uma série de alternativas, dentre as quais o RCS. Estamos avaliando o modelo de negócios com eles. Independentemente do RCS, é necessário ter esse diálogo multilateral e que os elementos do ecossistema encontrem um modelo que sustente o próprio ecossistema. Porque sem operadora não existe o ecossistema. Essa ficha caiu na cabeça de todos os players envolvidos.
Ainda há muitas reclamações de consumidores sobre SVAs. A Vivo vai contratar uma auditoria externa para monitorar seus produtos. A Oi pretende fazer algo parecido?
Isso faz parte do ponto de virada do ano passado: a saída do SVA 1.0 e a entrada no 2.0. Essa mudança não permite que determinados modos de operação e estratégias de negócios continuem. No nosso caso, para ter controle sobre a cadeia, temos um parceiro que faz isso há cerca de um ano, o Uotz. Ele monitora o serviço no lançamento, para ver se venda, cancelamento e experiência acontecem da maneira correta. Além disso, dado o crescimento do número de parcerias e de serviços com conteúdo sofisticado, estamos construindo uma ferramenta que vamos implementar este ano para controle e gestão do ciclo de vida de SVAs e de OTTs que sejam parceiros da Oi. Todos os nossos serviços passarão este ano, em algum momento, por essa ferramenta. Faremos uma série de relatórios de controle que monitoram o pós-venda, para medir como está indo a performance de cada provedor. Quem não tem qualidade ou trabalha com o modelo antigo, receberá punições que vão escalando se a prática não for alterada. Estamos bastante preocupados com essa questão. A qualidade da venda e da experiência no SVA 2.0 é fundamental. E é fator de decisão de parceria hoje, mais do que inovação ou potencial comercial do serviço. Além disso, apoiamos o MEF totalmente. Fui eleito para o board da América Latina. Acompanhamos toda essa discussão atentamente.
Poderia detalhar melhor o que essa nova ferramenta vai controlar?
Será todo o relacionamento com o cliente: a venda, o cancelamento, a cobrança.
Vai substituir o Uotz?
Não. O Uotz continua monitorando e checando a entrega e a qualidade do serviço. Essa nova ferramenta vai garantir o controle do ciclo de vida. É uma service delivery platform, ou SDP, como o mercado chama. Vamos buscar parceiros para prover essa tecnologia.
Há alguma outra tendência do mercado que você queira comentar?
Em termos de tendências, uma coisa que não falamos mas que você tem escrito bastante no Mobile Time e que vai crescer muito é inteligência artificial, machine learning e chatbots. A tendência aqui no Brasil para provedores de conteúdo é de crescimento absurdo. O Brasil é um mercado perfeito para isso, porque o brasileiro adora texto e está acostumado com interface de texto. Isso vai explodir, tanto para venda de serviços, quanto para autoatendimento. Veremos muitas empresas oferecendo serviços com inteligência artificial.
A Oi planeja lançar um chatbot?
Estamos planejando entrar nessa seara, mas isso está nas mãos de outra diretoria da companhia.