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Fogos vão continuar

A publicidade indispensável à sobrevivência da comunicação social está cada vez mais concentrada nas mãos de poucas agências multinacionais que detêm as contas das gigas.

Em 07/07/2017, há nove meses, publiquei aqui que os fogos florestais iriam continuar e consumir muito mais do que 50 mil milhões, como nos recentes dez anos e 64 vidas.


Incêndios em Portugal
Incêndios em Portugal


Ali resumi o que já tinha publicado em 2004, em jornais regionais e em 2013, em palestra, em Viseu, para a Proteção Civil e não só. A frase principal era "Há interesse em que continuem os incêndios. Pois é muito mais barato para algumas giga-empresas comprar madeira 'aleijada' para cortiça e papel".

Descrevi as nanocâmaras e software para integrar a previsão, em cada vale de risco, dos ventos, humidade, dificuldade em lá chegar, etc, às imagens de drones, filmadas dia/noite, para alertar bombeiros e polícia a posicionarem-se onde há elevado risco de ignições autónomas ou criminosas. Isto já se usa noutros países.

Nada se fez do sugerido e em outubro tivemos a repetição do drama. Agora, nove meses depois, o Governo põe em prática uma legislação em vigor há décadas e ignorada, de reduzir o efeito, mas não eliminar a causa. Limpar a mata ao redor de casas e vilas reduz a perda de vidas, mas não do valor em madeira, animais e pastos. Metade das ignições são criminosas, poucos 'loucos' são condenados, e nenhum dos mandantes. Muito bem planeadas, iniciadas onde o vento as alastra para sítios de difícil acesso.

As penas são meigas, compensam os 20 mil que os 'loucos' recebem para passar uns mesitos de férias na cadeia. Pois falamos de uma queda de preço na madeira 'aleijada' de uns 10 milhões em cada ignição. Repito o parágrafo final: "Há interesse em que continuem os incêndios. Vão morrer muito mais de 64 leais e esforçados portugueses e vamos perder muitos mil milhões em valor da floresta e do turismo rural". Muitos políticos, dantes como agora, por cá e na UE, dão a impressão de fazer algo.

Isto apenas para ganhar as próximas eleições. Pois os partidos dependem dos euros dos lóbis das gigaempresas. Nem o PR impediu o financiamento partidário desta forma, já proibido ou altamente regulado em quase toda a Europa do Norte. O escândalo da Cambridge Analytica na eleição de Trump foi aqui descrita em 11/11/16, na página 2.

Já em 2013 esta empresa tinha sido criada para influenciar as eleições nos EUA. Em 2015 o "Guardian" detalhou como funcionava. A vitória de Trump surpreendeu a muitos, mas não aos jornalistas que trabalham a sério, muitos sem salários, por amor à democracia e justiça. Eis o grande dilema, pois a publicidade indispensável à sobrevivência da comunicação social está cada vez mais concentrada nas mãos de poucas agências multinacionais que detêm as contas das gigas.

Quando uma vez indaguei o porquê de uma publicidade que não aumentava as vendas, o administrador de marketing disse que era a forma de garantir que a imprensa, mormente aquele semanário muito lido pela classe média, nada publicaria sobre as reclamações contínuas do seu carro. A mesma resposta induz-se da publicidade das telecoms em Portugal, que têm o maior índice de reclamações registadas e inoficiais em toda a UE. A ANACOM nada faz para as punir; a única forma de tentar reduzir os abusos da posição dominante seria pela comunicação social. Mas esta depende inteiramente dessa publicidade. A alternativa veio com as redes sociais e os blogs, que acabaram por ser também manipulados por PME especializadas em vender o seu serviço de neles atuar e produzir fake news e desacreditar os que partilham detalhes do mundo real para evitar tragédias como os fogos e as inundações.


Foto do colunista Jack Soifer




Jack Soifer
Consultor internacional, autor de "COMO SAIR DA CRISE, ONTEM E HOJE NA ECONOMIA, PORTUGAL RURAL" e o bilingue "PORTUGAL PÓS-TROIKA?"

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